sábado, 9 de abril de 2011

Perambulando e Papeando



Hoje assisti ao filme Comer, Rezar e Amar. Há muito tempo me falam para ler o livro e que é minha cara... Como estou sempre cheia de livros técnicos na fila, acabo deixando os romances para depois, uma vez que nunca acho que posso me dar ao luxo de ler livros meramente por lazer.

Ao ver este filme na locadora e apesar de saber que não é nunca a mesma coisa, tinha escutado uma crítica bem positiva e Julia Roberts na capa me animou. Valeu a pena, adorei!!

Ele me trouxe lembranças de minhas viagens solitárias. Como é bom viajar!! Na verdade, esta estória de estar sozinha que as pessoas tanto se espantam quando digo que vou a algum lugar acompanhada de mim mesma é uma ilusão.

Ninguém nunca está sozinho, nem Amyr Klink no meio do gelo. Ele estava cercado pela natureza, pelos seus pensamentos, por diversos animais que não costumava ver no Brasil e pelo seu diário, grande amigo!

No filme de hoje lembrei-me de tanta gente que já conheci pelas minhas andanças. Desde o simpático homem e sua esposa que me alugaram um quartinho certa feita em Morro de São Paulo, alguns amigos conhecem essa história: Roni da Refrigeração, quase uma lenda, até cada pessoa que conheci pela Europa, recentemente nos EUA e pelo Brasil.

Na Espanha o pessoal lá de casa brincava dizendo que fazia um amigo por dia. Conversava com quem aparecesse ao meu lado, no mínimo praticava o espanhol. Andei com um monte de intercambistas (gringos e brasileiros), espanhóis, tive um professor de xadrez psicopata me perseguindo, uma maluquinha Polaca carente que me ligava o tempo todo, uma Romena que confessou viva de esmolas quando ainda vivia na Romênia, uma Cubana que conseguiu fugir de seu país graças a um espanhol caridoso que casou-se com ela só para tirá-la de seu país, depois lhe deu abrigo e emprego. Teve uma velha Sul Africana PORCA que morava em um quarto de albergue compartilhado de seis pessoas em Londres porque era mais barato do que alugar um apartamento... Ela me roubou um brinco e depois devolveu quando disse que era de estimação, também me roubou uma garrafa de água mineral.

Todos os Brasileiros que viviam na Espanha em outras condições que as minhas (tinham saído do Brasil ilegais para ganhar a vida, muitos de favelas e realidades muito pobres). Uma alemã querida que conseguia a façanha de trabalhar no mesmo bar há 3 anos pelas madrugadas adentro e ainda estudando com muito esforço. Um argentino apaixonado pelo Brasil e que teimava em só falar português comigo. Um espanhol que me adotou somente por ser amiga de um amigo brasileiro dele. Uma chilena fofa que abriu a sua casa e me recebia carinhosamente em seu lar. Uma sérvia que me contava como era lutar pelo seu país durante a guerra e é uma das pessoas mais irradiantes que já conheci.

Teve ainda o italiano (já falei dele aqui) chato que adotei no natal de 2008. Um professor de macrobiótica que virou meu guia e amigo por Massachussets. Uma brasileira querida que conviveu um mês comigo mas que mora em meu coração como se tivesse sido muito mais tempo. Outra brasileira que caiu de pára-quedas em minha vida e que hoje tenho como irmã! Aliás, esses Brasileiros que conhecemos fora do Brasil são algo fora do comum... Teve o basco que me cortejava, me levava para restaurantes chiques, queria me apresentar à família toda e era tão tímido que me tratava como namorada mas nunca conseguiu pegar em minha mão, até que eu tomei abuso dele e ele não entendeu nada (como diria minha mãe: todo bonzinho é coitado). O chileno maluco que roubou uma garrafa de rum comigo em uma festa depois de uma longa estratégia e quando provei descobri que o gosto era horrível.

Os americanos queridos que viajaram comigo pela Suiça juntamente com os meus tios que não tenho nem palavras para descrever. A garota que trabalhava comigo na porta do supermercado contando quantas pessoas entravam para ganhar 40 euros. Meu amigo português do avião que toda vez que ia a Valencia me procurava e ainda me dava acessórios lindos de prata (ele tem uma joalheria) os quais uso com muito carinho até hoje. No avião ainda teve uma linda que conheci no Brasil em um vôo que atrasou horas e que até hoje mantemos contato... Pessoas que sentam ao seu lado no avião, nossa, tantas queridas!!

Muitos e muitos americanos extremamente sensíveis, amigos e carinhosos (ainda há quem diga que é um povo frio, tenho que discordar 100%). Uns conviveram comigo apenas cinco dias, mas rimos e choramos juntos e nos comunicamos até hoje que é quase inacreditável pensar que compartilhamos tão pouco tempo. Poderia escrever uma lista infinita aqui se continuasse puxando pela memória...

Claro que não precisamos viajar para conhecer pessoas interessantes, mas quando estamos fora de nosso reduto estamos mais abertos e normalmente com mais tempo para simplesmente bater um papo com alguém que chega perto. Por outro lado, em viagens solitárias temos a liberdade de simplesmente ignorar todo mundo sem ter que explicar a vontade de ficar sozinha, simplesmente não marcar nada com ninguém e curtir a própria companhia além da delícia que é estar em um lugar lotado e não conhecer absolutamente ninguém, a sensação de anonimato é priceless.

Hoje viajei com a personagem do filme e gostaria de propor que fizesse o mesmo, percorresse seus caminhos passados e lembrasse as pessoas que nele cruzaram com todo carinho que sentiu nesses encontros. Boa Viagem!!

Dia do Bobo



Nos Estados Unidos, o apelido para o dia Primeiro de Abril que por aqui chamamos de Dia da Mentira é bem mais simpático: April Fool´s Day, traduzindo é o Dia do Bobo!!

Nascer nessa data é uma grande responsabilidade. Mas afinal, quem é o bobo?

O bobo é aquele que ousa ser diferente, que não tem medo da crítica, que sai da linha, que inventa e se reinventa. O bobo é alegre, espontâneo, divertido. O mundo não seria nada sem ele!

Para mim é um dia super alegre, onde acordo recebendo telefonemas e mensagens de pessoas queridas dos pontos mais inusitados do planeta. É o dia que me sinto conectada com todos aqueles que amo e se lembram de mim e se fazem presentes de alguma forma (nem que seja só por pensamento). O fato de ser uma data marcante ajuda para ser bastante lembrada, é uma delícia!

Uma piadinha na data sempre cai bem, afinal é o único dia do ano que estamos autorizados a tirar um belo sarro da cara dos outros sem sermos mal vistos. Mas hoje vim escrever sobre esse outro sentido, o americano, do Dia do Bobo!!

Vim aqui celebrar todos os bobos que saíram da caixinha, do mundo convencional e foram originais de alguma forma. Foram eles que criaram a luz, o avião, o computador e outras tantas maravilhas. Um dia para homenageá-los é muito pouco! Devíamos incentivar esse espírito bobo SEMPRE! E eu como nascida em um dia tão especial, preciso manter esta idéia em mente.

Feliz dia para o bobo que está dentro de todos nós!!

Tempo de Despertar



Esta semana assisti ao filme Tempo de Despertar que trouxe a reflexão sobre a postura do profissional de saúde em relação ao seu paciente. Já no texto de Valdemar Augusto Angerami – Camon chamado: Breve Reflexão Sobre a Postura Profissional da Saúde Diante da Doença e do Doente li sobre diferentes nomenclaturas adotadas para identificar estas posturas. Vou falar um pouco delas, utilizando o filme como referência.

O filme supracitado permite que sejam identificadas algumas características acerca da postura do atendimento adotado pelos profissionais da área médica nele atuantes. O seu personagem principal trata-se do Dr. Malcolm Sayer que chega ao hospital psiquiátrico com vasta experiência como pesquisador e novato na área de atendimento humano. Logo de início, tem a sua capacidade colocada em cheque pela inexperiência clínica e realmente demonstra-se um pouco “desajeitado” em seus primeiros dias de trabalho. O fato de não seguir um padrão de atendimento lhe permite ter, entretanto, uma postura diferenciada e cheia de personalidade.

Na área de saúde, criou-se um estigma da impessoalidade para com o paciente que levada ao extremo é denominada calosidade profissional (frieza absoluta, foco total no sintoma) e de forma mais amena considerada como um distanciamento crítico (mesmo assim não permite criar vínculo com o paciente e o deixa com a sensação de “órfão” em seu tratamento). Existem ainda duas outras posturas que denotam maior aproximação entre o profissional e o paciente, são elas: empatia genuína (simbiose levada ao extremo) e o profissionalismo afetivo (constitui um envolvimento menor, porém suficiente para que o paciente não se sinta desdenhado).

Observando-se o comportamento do Dr. Sayer, percebe-se uma postura que foge aos padrões que estamos acostumados a ver em hospitais e outros centros de saúde. O seu perfil de pesquisador o faz logo de início buscar o entendimento profundo do quadro dos pacientes que vêm a tratar (portadores de uma síndrome que os deixa catatônicos). Antes dele, estes doentes eram manipulados como plantas num jardim, onde ficavam estáticos recebendo suas “rações” diárias essenciais à mera sobrevivência. A postura adotada pelos precursores do Dr. Sayer demonstra um claro exemplo de calosidade profissional onde havia sido perdida a noção total de que o que se tratava como plantas eram na verdade seres humanos.

A psicologia talvez explique a atitude fria (exemplificada acima) comum a diversos profissionais da área de saúde como um mecanismo de defesa para que os mesmos não se deixem tocar, e conseqüentemente sofrer, com o dia-a-dia de seus pacientes. Ocorre, entretanto, que são profissionais que decidiram deliberadamente lidar com a saúde humana que é como conceito, constituída de corpo e alma, repletos de sentimentos (físicos e psicológicos). Por este motivo, é incompreensível (para não dizer inaceitável) a vertente que vem sido tomada em relação à frieza de determinados profissionais para com os seus pacientes.

Retornando ao filme, podemos notar a trajetória evolutiva do Dr. Sayer em relação à sua mudança de atitude em relação aos pacientes, assim como na forma como isso acabou contaminando toda a sua equipe. No início, o novo médico trazia consigo características do distanciamento crítico, que o possibilitava perceber reações em seus pacientes, algumas referentes a reflexos motores e outras a emoções. Este distanciamento o permitia elaborar estratégias de observação que o levava a descobrimentos de novas reações como quando pintou o chão, jogou bolas ou colocou músicas que estimulava os convalescentes. Sua equipe, por conseguinte passou a adotar um tratamento mais criterioso, abandonando a calosidade profissional e adotando também o distanciamento crítico chegando até ao profissionalismo afetivo. Agora prestavam maior atenção a detalhes acerca da vida inerente àqueles humanos ora tratados como plantas e cuidavam deles com carinho.

O tratamento do Dr. Sayer evoluiu para uma relação mais simbiótica quando conheceu um paciente chamado Leonard que estava com sua mãe sempre por perto, senhora esta que pôde lhe fornecer informações mais detalhadas acerca da evolução da doença de seu filho. A sua alma de pesquisador e comprometimento com a causa que já havia abraçado o fez aproveitar esta oportunidade e o mesmo mergulhou de cabeça em um estudo minucioso do caso do paciente Leonard, acreditando ser o caminho para curar a misteriosa doença. Não contava, entretanto, em ser envolvido pela relação pessoal com o paciente, numa atitude de empatia genuína. Aos poucos passa a praticamente residir no hospital, sem vida própria, em vigília constante até o ponto de mostrar-se desesperado quando começou a ver falhas no tratamento até então impressionantemente bem sucedido. Até que ponto estaria o médico envolvido com a cura e sua pesquisa científica ou com o paciente em si?

A atitude mencionada acima já foi muito comum nos tempos dos médicos de família que acompanhavam seus pacientes em casa, participando de suas rotinas domésticas a ponto de se tornarem como membros da família, tornando dificílima a separação entre a relação profissional e afetiva. O meio termo entre este tipo de postura e a frieza explicitada anteriormente é justamente o Profissionalismo Afetivo, postura que pode ser percebida no tratamento do Dr. Malcom para com os demais pacientes, portadores da mesma doença que Leonard. Nestes casos, o mesmo manteve uma relação humana, afetuosa e próxima sem desestabilizar-se emocionalmente, o que inclusive lhe permitiu maior lucidez do que nos momentos em que se viu tomado pela relação quase que passional que estabeleceu com Leonard.

As distintas atitudes do mesmo médico ao longo do filme é um claro sinal de um tratamento humano, onde não é possível mecanizar sentimentos e atitudes. Certamente o mesmo não planejou a relação que criou com o paciente Leonard que ocorreu de forma espontânea. É perigoso julgar sua atitude como certa ou errada, pois estamos falando de seres humanos, repletos de sentimentos (tanto os profissionais quanto os pacientes) que estarão sempre correndo o risco de se envolverem emocionalmente. O mais importante desta análise é chamar atenção de que o tratamento na área de saúde estará sempre envolto de sentimentos e que a abordagem afetiva (ou não), por parte dos profissionais, sempre afetarão nos resultados.

Há ainda outro tópico importante a ser abordado em relação ao filme referente à qualidade de vida dos personagens. Voltando a falar do Dr. Sayer, nota-se um comportamento nele de total envolvimento com o trabalho e desligamento com a vida pessoal e principalmente afetiva. Uma das enfermeiras de sua equipe demonstra desde o início um carinho especial e uma vontade de aproximar-se dele. Entretanto, o mesmo está tão envolto com suas atividades profissionais que nem percebe. Ao fim do filme, desperta para esta nova possibilidade de entretenimento abrindo espaço para uma aproximação pessoal maior com a dita enfermeira. Como julgar a qualidade de vida deste profissional? Trata-se de um conceito subjetivo, logo, o que pode parecer essencial na vida de uns para outros é de tão pouca importância que pode ser até esquecido quando existem “coisas mais interessantes” em mente. Como julgar o que é mais interessante? Para uns pode ser uma partida de futebol, para outros namorar, ler, praticar um esporte, viajar ou até comer.

Em um contexto geral, temos a impressão de que a qualidade de vida alcançada ao final do filme foi melhor do que a existente no início. Ao fim da estória os pacientes retornaram ao mesmo estado catatônico do início, todavia agora passaram a receber um tratamento mais humano, sendo mais bem cuidados pela equipe médica. Esta por sua vez, teve a oportunidade de conhecer o outro lado daquelas pseudo-estátuas e a partir daí a rotina tediosa de cuidar de plantas-humanas passou a ter curiosidades, lembranças e buscas de novos sinais, logo, a equipe de médicos e enfermeiros do hospital passou a trabalhar com mais motivação e alegria. O Dr. Sayer, após experimentar uma fase de total absorção com o trabalho se permite extravasar um pouco e vivenciar algo novo, baseado na relação humana que ele ironicamente acreditava não ter nenhum potencial para.