segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Culinária ZEN


Outro dia estava conversando com um amigo teólogo sobre quando sentimos que estamos conectadas com Deus. Tem gente que frequenta missa, os surfistas dizem que é quando estão no mar, os alpinistas dizem que é quando escalam montanhas, há quem diga que é quando medita e eu, nem surfo, nem escalo montanhas, nem freqüento missas e raramente sento em posição de lótus para meditar.

Cozinhar para mim faz parte de um ritual zen, onde me desconecto de tudo e foco inteiramente no que estou fazendo. É um processo que pode levar horas e começa quando preparo um cardápio, depois vou à feira e escolho cuidadosamente cada ingrediente que vou utilizar. Antes de ir à cozinha, gosto sempre de tomar um banho para renovar e refrescar minhas energias. Costumo colocar uma música suave, que pode ser erudita, jazz, rock, MPB, pop e/ou o que estiver de acordo com o meu estado de espírito do dia.

A partir daí é como se estivesse dançando, cada ato é uma coreografia. A música que me guia são meus instintos criativos, que surgem naturalmente. Gosto de cozinhar principalmente vegetais. Observar uma variedade de cores, formas e texturas, limpá-las cuidadosamente, depois cortá-las de acordo com a forma com que pretendo cozinhá-las. É uma arte: combinar cores, sabores, texturas, temperos e principalmente utilizar as mãos, dando e recebendo um tanto de energia numa troca sublime com a natureza.

Gosto de cozinha limpa e organizada. Sempre corto tudo que vou usar e separo em cumbucas, limpando a minha tábua de corte, faca e bancada, entre cada ingrediente. Minhas panelas são todas em inox, brilhantes e de um mesmo conjunto, formando uma estética agradável em cima das minhas seis bocas de fogão. Quando começo a etapa do cozimento, procuro ter todos os temperos que pretendo usar à mão. O fogão fica com a sua chama mais ou menos na altura do “hara”, que segundo a tradição do extremo oriente é o centro energético do corpo. Sentir o calor do fogo no ventre e perceber a transformação dos alimentos é mágico.

Minha primeira formação é de arquiteta e minha mãe costuma dizer que faço arquitetura de comida. Realmente, adoro arrumar um prato, selecionando as cores e harmonizando-o. Esta arte inclui a escolha da louça, do talher (ou hashi), toalha ou jogos americanos, flores, etc. Bernadette Kikuchi, uma das melhores cozinheiras que já conheci, e que tive o privilégio de ser aluna, chama sua culinária de Arte Fundamental da Vida. Até hoje não consegui encontrar um nome que descreva melhor esse ato de amor e arte.

Tudo que descrevi é o somatório de um momento onde todos os sentidos se envolvem. O tato no manuseio dos alimentos, a visão na apreciação das formas e cores, o olfato quando sai aquela fumacinha cheirosa pelas frestas entre a tampa e a panela, a audição prestando atenção ao chiado da panela de pressão, toque da faca na tábua de corte e por fim, o paladar, na hora que mastigamos e ingerimos o resultado da mistura de tantas energias. Somos o que comemos, uma alimentação consciente resulta na nutrição saudável do corpo e da alma.

Adoro comer a minha própria comida, mas também aprecio demais a culinária de outras pessoas. Através dela sentimos os mais diversos sabores e absorvemos uma carga energética variada. Diversificar o paladar resulta numa mente criativa e apurada. Por isso, sou bastante exigente na escolha do que como, bem como o ambiente onde faço minhas refeições, se possível fazendo uma visita à cozinha para sentir como é o astral de quem prepara a comida. Cozinhar, alimentar os outros e me alimentar, para mim, são formas diárias de beijar o padeiro!

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