quarta-feira, 3 de abril de 2013

O tal do ENADE


Acabei de ficar sabendo que um professor recomendou que a turma fizesse as provas do ENADE dos anos de 2004, 2007 e 2010 para complementar o estudo para a prova de sua matéria. Só de escutar esse nome tenho calafrios. Você deve estar se perguntando por que e por isso resolvi compartilhar uma historinha pessoal.

Quando fiz a minha primeira faculdade, arquitetura, no semestre em que ia me formar, percebi que ia me formar em tempo recorde e que não havia necessidade para tanta pressa, até porque sempre tive dúvidas em relação a escolha desta carreira. Então, decidi adiar um pouco a formatura para fazer intercâmbio (através do convênio da UFBA - por isso não podia me formar) para a Espanha: realizar um sonho, viver em outra cultura, abrir a cabeça, me abrir para novas ideias, aprender outro idioma. Sempre soube que a vida requer muito mais do que aquilo que os livros ensinam e tinha certeza que a experiência seria fundamental na minha formação pessoal e profissional. Nem preciso dizer que foi uma das melhores coisas que fiz na vida, né?

Quando voltei, tive que me matricular novamente na faculdade para apresentar o meu Trabalho Final de Graduação, que deixei 95% pronto antes da viagem, já tinha feito pré-banca e tudo. As apresentações só seriam no final do semestre e enquanto isso aproveitei para fazer um último estágio em uma área que não tinha tido oportunidade de explorar a fundo durante o curso. Não contava que essa matricula me traria uma surpresa: fui sorteada para fazer a prova do ENADE. Até aí tudo bem... 

A prova seria num domingo e eu, toda compenetrada decidi não sair no sábado à noite, para dormir cedo e ir bem descansada fazer a prova. Quem mora aqui ou já esteve em Salvador vai entender o que vou dizer agora: moro no bairro da Graça e me colocaram para fazer a bendita prova em Itapuã! Tinha que literalmente cruzar a cidade. Mas o pior estava por vir, Salvador não tem horário de verão, então a prova que seria às 13:00 em todo o Brasil, aqui seria às 12:00. Resumo, teria que cruzar a cidade (praticamente 25km), numa manhã de verão, em pleno domingo para fazer uma prova que não ia mudar em nada a minha vida. Um favor que prestaria à nação. Bem, naquele dia estava com a maior boa vontade do mundo, acordei cedo e saí de casa com DUAS HORAS de antecedência, levando um livrinho para ler enquanto esperava a prova, pois tinha certeza que ia ter que esperar um bocado, mas meu sangue suíço adora uma pontualidade e não queria correr o risco de atrasar.

O acesso ao colégio onde a prova seria realizada era única e exclusivamente pela orla e adivinhem? Prova + Praia + Verão + Domingo de Sol = maior engarrafamento de minha vida. Não tinha como desviar, retornar, fazer um caminho alternativo ou sequer estacionar... Fiquei ali, parada no carro, o sol queimando lá fora, vendo o tempo passar, sem poder fazer nada. Com muito sacrifício consegui chegar até a Av. Dorival Caymi (que liga a orla à Av. Paralela), estacionei meu carro no primeiro lugar que vi e saí literalmente CORRENDO pela rua para conseguir chegar à tempo no local da prova. Cheguei CINCO minutos atrasada, encontrei os portões fechados e uma MULTIDÃO lá fora. Assim como eu, a maioria das pessoas também não conseguiu chegar à tempo. Todo mundo revoltado!! Com razão!! Estávamos fazendo um favor ao Ministério da Educação indo fazer aquela prova em pleno domingo de sol e o que recebemos em troca? Nem CINCO minutos de boa vontade, tolerância...

Fomos instruídos a escrever uma justificativa para o INEP e assim o fiz. Peguei um relatório do trânsito com o Detran, anexei meu comprovante de residência, o local da prova, um mapa do Google mostrando o tamanho da rota e expliquei na íntegra o ocorrido. Maldita hora que meus pais me ensinaram a ser honesta!! Todas as pessoas que enviaram falsos atestados médicos foram liberadas de fazer a prova. Resultado: eu tive meu diploma detido por mais um ano e meio (já tinha atrasado minha formatura um ano e meio à essa altura, por causa do intercâmbio e do semestre que tive que me matricular na volta), pois, mesmo que todas as suas obrigações com a instituição de ensino estejam findadas, sem o comprovante do ENADE não é permitido colar grau. Você deve estar se perguntando porque um ano e meio a mais. Bem, fiz a prova um ano depois desse ocorrido e tive que esperar a liberação chegar na faculdade para poder colar grau... Um processo! Resumindo, essa brincadeirinha de ENADE me custou dois anos trabalhando sem diploma. Minha sorte foi que tinha uma parceira que assinava os projetos por mim e não tentei nenhum concurso público, vaga de mestrado, nem nada parecido e a falta do diploma não me acarretou maiores prejuízos. Mas convenhamos que poderia ter sido um problemão, poderia ter pedido a vaga de uma grande oportunidade na vida por não portar o diploma de uma faculdade que estava concluída com louvor!

Detalhe, a prova que fiz no ano seguinte nem era específica da área de arquitetura e sim uma prova geral só para pessoas, como eu, poderem cumprir uma penalidade cruel, uma vez que a prova específica de arquitetura só ocorre à cada quatro anos.

Preciso dizer que tenho pavor desta prova?? Na Federal ninguém leva isso à sério, entregam a prova em branco... Coisa que apesar de toda a minha indignação não tive coragem de fazer.

Quando voltei para a faculdade (agora no curso de nutrição) descobri que ENADE nas faculdades particulares parece vestibular nos meus tempos de colégio. Os professores e coordenadores adoram falar nisso, fazem provas no modelo do ENADE, simulados... Ano passado tive que fazer um simulado chatíssimo da bendita prova. Pensem em algo cansativo!! Levei quatro horas, saí com a cabeça explodindo e não consegui terminar a prova. O interesse das faculdades particulares é obter uma boa nota e melhorar seus nomes no mercado. Acharia a proposta interessante se não tivesse tido essa experiência negativa, se a prova não estivesse atrelada com a possibilidade de colar grau e se não soubesse que na Federal ninguém está nem aí para o ENADE (a Federal tem nome e ninguém deixa de estudar lá porque teve um desempenho ruim no ENADE).

Fico lembrando dos tempos de escola. Nunca consegui compreender aquela obsessão por vestibular. As pessoas passavam a vida estudando para um bendita prova, ninguém estava interessado em aprender coisas para a vida. Como se o aprendizado de cerca de quinze anos escolares só servisse para uma coisa: passar no vestibular. Quantas pessoas conheço tinham desempenho acadêmico ótimo na escola, passaram no vestibular, mas não cultivam o hábito da leitura, não frequentam museus, não apreciam arte, música...

Sobre o ENADE, minha preocupação é que o ensino das faculdades particulares se direcione à preparação dos alunos para um bom desempenho na tal prova e o foco do ensino fique em segundo plano. Por outro lado, sou super a favor de provas como a da OAB que restringem a atuação profissional àqueles que comprovem que realmente fizeram um bom curso. Só que a OAB não impede ninguém de se formar... Acho que com tanta faculdade abrindo por aí, uma prova desse gênero para todas as áreas seria muito interessante para garantir à qualidade dos profissionais que são lançados no mercado de trabalho. Só que a proposta do ENADE está longe de ser essa e a meu ver, está colocando em risco a qualidade do ensino e dos alunos. Será que no futuro teremos profissionais "experts" na realização de provas e deixando a desejar em suas áreas de atuação? Espero que não!!!


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