terça-feira, 18 de setembro de 2012

Inversão de valores na nutrição

Nutricionista: Promotor de saúde ou de sabor?

De onde veio a ideia que para ser saboroso tem que ter açúcar? Olha que sobremesa com a cara deliciosa!
Imagem retirada do Google Imagens



Uma pergunta que respondo frequentemente é como está sendo a experiência de fazer faculdade de nutrição, se entro em conflito com os professores, etc. Graças a Deus gastei todas as minhas cotas de me desgastar com professores nos tempos da faculdade de arquitetura... Apesar de discordar com um monte de coisas, acho que sou até bem querida entre os professores e colegas. Comparando com a minha primeira faculdade, considero-me bem mansinha hoje em dia, entretanto, isso não me impede de ter uma visão crítica. Ainda bem que tenho o blog!!! Hoje decidi relatar algumas indignações...

Este semestre estou com algumas disciplinas que tenho que respirar fundo...!

Planejamento de cardápios. Nesta matéria aprendemos a planejar cardápios de todos os tipos. A primeira parte consistiu em planejar cardápios para refeitórios de grandes empresas. Uma das atividades foi de planejar um cardápio de 30 dias para uma Unidade de Alimentação e Nutrição (UAN), sem repetir nenhum prato. Nestes casos o prato principal precisa ser carne e perguntei se poderia fazer uma sugestão de cardápio vegetariano, incluindo somente peixe se fosse o caso. O meu argumento foi que está começando a existir uma crescente demanda vegetariana e que é importante saber planejar um cardápio balanceado e criativo com este enfoque. A resposta foi negativa e lá fui eu, pesquisar praticamente 30 formas diferentes de preparar carne bovina, seguidas de mais 30 formas diferentes de preparar porco, frango, vísceras e peixe. O cardápio precisava ter dois tipos de carnes ao dia: sendo uma bovina e a outra variável, de preferência frango. Fazer isso no papel foi até tranquilo, o problema seria executar na aula prática.

Primeiro dia de aula prática. A sala foi dividida em grupos e eu fiquei com a salada. Adivinha qual foi o único prato que terminou na hora da degustação? Minha salada! Infelizmente não tirei foto, mas foi caprichada e diferente de tudo que meus colegas já comeram. Um sucesso!! Neste dia teve carne bovina e peixe, sendo que o peixe, que deveria ser uma opção mais light do que a carne, foi feito de duas formas: frito e enrolado com presunto e queijo, lotado de molho branco. A impressão que me dá é que as pessoas não sabem fazer uma comida light... Por isso que muita gente que não tem opção de onde comer (quem trabalha em fábricas ou obras distantes) acaba engordando tanto com a comida do trabalho. São terríveis!!! Ah, esqueci de comentar sobre as sobremesas e sucos preparados na aula descrita: açúcar PURO! Mais do que a carne (não sou obrigada a fazer e nem a provar), tem me incomodado bastante que os professores não se preocupam nem um pouco em reduzir o açúcar dos cardápios e das  receitas, fazer substituições, etc...

Em outra matéria temos que desenvolver um produto com aproveitamento integral do alimento. De inicio surgiram várias sugestões cheias de açúcar... Graças a Deus consegui convencer a minha equipe de fazermos algo “sugar free”. Assim, mexemos em várias receitas até criar a nossa própria barrinha de cereais utilizando casca de frutas como: laranja, melancia, banana e mamão, com linhaça, gergelim e aveia e adoçada com mel. Depois de testar a receita de cinco formas diferentes chegamos à opção final. Conseguimos tirar o açúcar mascavo, reduzir o mel à metade e tirar o óleo, a manteiga e a margarina das receitas originais e chegamos a um produto muito saboroso e de ótima consistência!

Hoje passamos a tarde preparando as barrinhas no espaço gourmet da faculdade para fazer a degustação com os alunos do turno da noite. Enquanto estávamos no espaço gourmet, um grupo de formandas da nutrição preparava lanches para receber alunos de escolas para falar sobre o curso. Ao todo foram uns quatro grupos de jovens lá. Fiquei observando e os sucos que elas preparavam tinham mais açúcar do que fruta. Fiquei chocada! Tantas opções de sucos maravilhosos sem açúcar... Como é que pessoas que deveriam PROMOVER a saúde são tão relapsas neste aspecto? Preocupação ZERO!!! O importante é fazer o suco render e tome-lhe açúcar! Isso é mentalidade de nutricionista?

Na aula de planejamento de cardápios a história se repete. A professora fala que refresco não é bom, mas que infelizmente é o que cabe no orçamento das UANs e que inevitavelmente teremos que colocar. Não seria papel do nutricionista convencer os responsáveis pelas UANs de que é fundamental que haja um suco não adoçado da fruta? Se o nutricionista não assumir esse papel, quem irá assumir? Quando ele assina uma dieta contendo um refresco ele está sendo mais que conivente, ele está promovendo algo que todo mundo está careca de saber que é péssimo: lotado de corantes, aditivos químicos e açúcar.

O Programa de Atenção ao Trabalhador (PAT) preconiza que é obrigatória uma opção de fruta como sobremesa em UANs. A professora fala isso para a turma, mas acrescenta que dificilmente alguém consegue seguir esta norma, pois frutas são mais caras e demandam mais manipulação que a maioria das sobremesas adoçadas artificialmente. Fala que em termos de orçamento é muito mais fácil colocar uma paçoca ou um bombom de sobremesa... É conformismo demais um nutricionista elaborar um cardápio contendo uma sobremesa açucarada no lugar de uma fruta, por questões financeiras, quando tem TOTAL apoio da LEI. Não seria papel do nutricionista mostrar a lei para quem lhe contrata para fazer o cardápio e dizer que a sobremesa será fruta e PONTO FINAL? Se os orçamentos são tão apertados e impossíveis de cumprir com os ingredientes e alimentos adequados não será porque os nutricionistas estão se prostituindo e se submetendo a prescrever algo que sabem (ou pelo menos deveriam saber) que não é adequado para a promoção da saúde? Não cabe ao nutricionista convencer o seu contratante a fazer as coisas da forma correta, mesmo que isso signifique um acréscimo no orçamento?? O argumento é básico: melhora na saúde dos funcionários, que serão menos obesos, menos hipertensos e mais saudáveis em inúmeros aspectos.

Hoje na aula de tecnologia de alimentos fizemos geleias. Sabe qual era a preocupação da professora?? Fazer geleias saborosas! Nutricionista é profissional da área de saúde... Tem que se preocupar em fazer saúde com sabor. Quem se preocupa só com sabor são as pessoas da área gourmet. Aí decidi criar minha própria receita e tentar fazer uma geleia sem açúcar. Fiz uma de melancia que ficou super doce e gostosa, entretanto, a consistência não era igual a dessas geleias industrializadas, porém, serve perfeitamente para passar no pão, em torradas, etc... Sabe o que a professora me perguntou? “Por que essa obcessão em fazer algo sem açúcar?” Aí me pergunto: Será que ela não deveria ter buscado receitas de geleias sem açúcar para ensinar para a turma? O pior é que ninguém pensa nisso... Uma turma de futuros nutricionistas, usando quilos de açúcar na maior naturalidade. Pergunto-me, é isso que pretendem comer e prescrever? O mercado tem tantas opções de geleias 100% frutas hoje em dia, para mim não é menos que a obrigação de um nutricionista prescrever uma dessas... E se for ensinar seu paciente a fazer uma geleia em casa, que seja sem açúcar. Mas, se na faculdade os alunos só aprendem a fazer geleia, sucos e sobremesas com açúcar, como poderão prescrever algo diferente ou se quer ter algum tipo de preocupação deste gênero?

Não é a toa que alunas, prestes a se formar, ao apresentar o curso de nutrição (como exemplifiquei acima), servem sucos LOTADOS de açúcar para jovens em formação... É só olhar o que comem no intervalo da aula para ver que não absorveram nada do que deveriam ter aprendido. O que mais vejo são alunos de nutrição comendo doces, chocolates, frituras, refrigerantes, refrescos, salgadinhos e um monte de porcarias diariamente na faculdade.  Esse é o nível de profissional que está sendo formado nas universidades... Preocupante, não?

2 comentários:

  1. Ainda bem que tem pelo menos uma Camila fazendo faculdade de nutrição... Ainda há esperança!!

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